4 de jul. de 2010

Ela tomou um avião para o seu destino, mesmo sabendo, que aquele destino rimava com desatino. Na superfície vestida, havia uma paisagem repleta de transparências, que carregava uma nudez absolutamente nova e pronta para ser partilhada.
Seu corpo era um lugar onde as coisas ainda não podiam ser nomeadas. Era preciso acontecer uma operação delicada no corpo da letra. A mulher não existia.
Ela precisava ser inventada, contada, tocada, sentida, despida, desvelada.
Costurou um vestido para aquele momento, e sabia que era necessário um corte para se fazer um vestido- segunda pele, superfície que abriga aquilo de mais profundo. O corte era radical era corte em si, um ato, uma loucura. Era também aquilo que Blanchot dizia bem: '' ... fazemos poesia somente no puro lampejo do corte..."

Fazer vestido era como escrever cortar o infinito com palavras, dar contorno à violência do corpo imanente. Cobrir a paisagem da "carne afetada pela escrita e convidada ao devaneio", como bem já dizia Barthes.
Cortar o tecido na trama, para fazer emergir o feminino e a possibilidade de novas linhas era se deparar com aquilo que estava escrito e com a escritura do porvir.
Queria suas asas livres e desejava sentir a força da paisagem que desce sobre o corpo e revela as rememorações fotográficas do desejo.
Foi ao encontro disso...
Fechou os olhos e as portas se abriram. Era a descoberta do mundo, amor saltando dos olhos. Uma brisa nos cabelos e um vento na pele fizeram com que ela sentisse a radical alteridade que se fazia presente.
Ele disse o essencial e o vestido saiu voando pelas mãos delicadas e precisas daquele que partilhava com ela o maior dos segredos.
Sem vestido e descoberta, vivia no corpo uma nudez inédita e libertadora.
Era uma cena bonita, quase um poema.
Ele só precisava de um céu cheio de estrelas e das palavras encantadas do poeta.


http://flordebelalma.blogspot.com/ (um blog que eu adoro e dona desse texto maravilhoso)

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